O VENTO FORTE QUE ESPANTA A DITADURA –
Resenhas Teatrais do Palco Giratório 2013
O grupo Teatro
Ventoforte (SP) apresentou dois espetáculos no Circuito Especial do Palco
Giratório: História de Lenços e Ventos
e As 4 Chaves. O espetáculo História de Lenços e Ventos completa 40
anos de existência! Foi concebido em plena ditadura militar da América Latina e
trabalha temas espinhosos, como a opressão, a supressão da liberdade, a
violência física, e a frustração; tudo isso para crianças. O grupo trabalha com
linguagem infantil, ensinando através da arte, se preocupando em transmitir um
pensamento, antes de tudo, libertário. Mistura no mesmo espaço, o ator e o
boneco, cantando e dançando, celebrando a vida numa grande festa. O espetáculo História de Lenços e Ventos (18/05) é
uma grande brincadeira de quintal. Tudo parece uma bagunça sem fim, mas logo se
pode perceber que cada coisa tem seu lugar e seu espaço, como uma grande caixa
de brinquedos. O dono da caixa é Ilo Krugli, um palhaço nascido na argentina,
diretor, ator, dramaturgo e mentor do
Ventoforte, que viveu na carne os mais duros anos da ditadura, mas que ainda
trabalha e deseja um mundo melhor. É dele que sai a energia do grupo e a
proposta mais contundente: falar para a criança e para os que não deixaram de
ser crianças. E é como crianças que devemos participar: coração aberto e puro.
O desavisado pode se chocar e acabar perguntando: onde vamos parar com isso? O
que interessa é o caminho e não o desfecho da história. No espetáculo a
história muda de rumo como o vento do título, sem se preocupar em continuar
nada. Começa de um jeito, toma outro rumo, antecede trechos, volta e retoma,
num ritmo que lembra mais uma criança brincando do que um espetáculo
convencional de teatro. Há momentos fantásticos em que a história deixa de ser
contada porque o ator não quer dar o texto por considerar forte demais aquela
notícia. Somos chamados para a brincadeira pelos bonecos Manuel e Manuela,
manipulados pelo próprio Ilo, que têm uma personalidade caótica e
temperamental, lembrando bastante os bonecos de feira do nordeste. Por uma
confusão difícil de descrever, Manuel e Manuela se trancam numa mala e decidem
que não farão o espetáculo. O elenco precisa, então, tomar outro rumo e resolvem
fazer outra história a partir dos lenços que eles trazem consigo. Conhecemos a
Azulzinha, um lencinho muito simpático, cujo sonho é aprender a voar. No desejo
de realizar o seu sonho Azulzinha se mete em muitas aventuras, indo parar no
Reino Medieval, sequestrada para casar com o Rei de Metal. Acontece que a
intrépida personagem possui um admirador, o Papel, que ela conheceu no quintal
onde morava. Papel faz de tudo para salvar sua amada, lutando para superar a
opressão tirânica e a violência. Num momento impressionante, um homem
encapuzado sequestra Papel e o queima numa bacia. Frustração. O elenco fabrica outro
boneco, um Papel mais forte com o coração de celofane. Ele ganha escudo e lança
e vai lutar com o Rei de Metal para conquistar Azulzinha. Como a luta é de
sombras, o Papel ganha do Metal e tudo acaba em música. Inevitável sentirmos os
ares da história; o espetáculo fala da ditadura o tempo todo. O desaparecimento
de Azulzinha; a opressão do rei tirano; a cidade Medieval, onde tudo é
arrumadinho e perfeito; a destruição do corpo do personagem Papel e sua
reconstrução, mais forte; alegorias de uma época que inspirou o espetáculo e
que formou a base forte do grupo. Vida longa ao Ventoforte e à IloKrugli; que
sua contribuição se multiplique pelos corações que tocou com sua arte.
Juliana Capilé e Tatiana Horevicht
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