Heitor Villa-Lobos incorporou ao seu repertório
musical o som das aldeias. Miguelio Hãwi e Paulo Rãirité fazem o percurso
inverso: levam o som da cidade para a aldeia. De forma brilhante, tal qual o
maestro e compositor carioca, a dupla formada por índios da etnia Xavante,
autodenominada A’uwé, da aldeia Santa Clara, terra indígena Parabubure, em
Campinápolis (MT), lança o CD Tsidupo às 19 horas desta quinta-feira (22) na
Casa do Parque, em Cuiabá. A entrada é gratuita.
O local estará totalmente ambientado
para a apresentação da dupla Xavante, o que inclui, além de artesanato e
indumentárias indígenas, fotos produzidas e cedidas por Antônio Carlos
Banavita. Vai ser uma verdadeira viagem ao rico e exótico universo musical
indígena, que começa a sair do anonimato para surpreender e encantar os
apaixonados pela diversidade cultural e que moram na cidade.
A idealizadora da Casa do Parque e
produtora de Tsidupo, Flávia Salem, confessa seu encantamento pelo material e o
prazer de lançar a dupla no espaço cultura mais eclético de Cuiabá. “A Casa do
Parque se transformará num mágico espaço Xavante por uma noite... Tenho certeza
que a plateia se sentirá privilegiada em assistir a apresentação ao vivo de
Miguélio e Paulo como eu me senti ao transformar as lindas canções que conheci
através da Anna Ribeiro e do Xisto neste cd que será lançado. É uma
oportunidade ímpar conhecer a meiguice que existe ao lado do instinto guerreiro
dos Xavantes. Estou muito feliz em participar deste projeto”, observa.
Tão satisfeito está o produtor rural
José Pupin, patrocinador oficial do CD. "Investir num trabalho tão
delicado e inédito como este é ter a consciência da importância da
imortalização da nossa cultura, de nossas raízes. O grupo Pupin sempre cumpriu
com sua parcela de responsabilidade social por meio do Instituto Antônio Pupin
e contribuir com os irmãos indígenas só vem a enriquecer nossa
história", afirma José Pupin.
A historiadora Anna Maria Ribeiro Costa
relata que o universo da música indígena Xavante, ainda tão pouco explorado
pelos não indígenas, se faz presente na composição dos primos da dupla Tsidupo,
que intercalam às suas vozes instrumentos musicais tradicionais – flauta e
chocalho – e o violão.
Em 2008, ano de nascimento da dupla,
Miguelio iniciou seus estudos musicais em Rondonópolis, momento em que
reconheceu sua paixão pelo violão, adquirido em Barra do Garças com recursos
próprios. É Miguelio quem declara: “amei o violão”. O sopro e a percussão
produzidos por Paulo Rãirité unem-se à vibração das cordas do violão de
Miguelio Hãwi e suas vozes nos conduzem a uma atmosfera de encantamento.
O tsidupo, instrumento musical de
sopro formado por dois tubos que se unem por um cordel de algodão, detalha Anna
Maria Ribeiro da Costa, traz na sequência ligeira das notas musicais a
lembrança do canto do inhambu. Sua melodia encanta as máscaras usadas no ritual
de preparação masculina, nas sessões de cura, na confecção de flechas e também
nas expedições de caça e coleta nos locais onde há taquaras em abundância,
matéria-prima destinada à sua confecção.
O dzo, instrumento musical de
percussão, é considerado pela sociedade Xavante como um importante símbolo de
posição social. Pertencente aos homens de idade avançada, ao ser entoado exige
o respeito dos ouvintes. Cabaça e haste de madeira são unidas por um preparado
de base vegetal com propriedades mágicas. Acreditam os índios que seu dono está
protegido de doenças. Mas, o dzo precisa das vozes masculinas para existir. É
avistado principalmente nos rituais do Way’á, de nominação das mulheres e da
corrida de toras de buriti.
Flauta e chocalho acompanham o violão
de Miguelio que empresta ao som do cerrado e das matas os acordes do mundo
urbano. A dupla Tsidupo, de Miguelio e Paulo, apropria-se de maneira singular
dos conhecimentos milenares de seu povo e daqueles apreendidos com gentes das
cidades para compor as letras de suas músicas. Paixões, amores proibidos,
desamores, a jovialidade e a beleza femininas, a enfermidade, a saudade de quem
partiu e as influências citadinas são fontes de inspiração para suas
composições musicais. Aldeia e cidade unem-se em nome da sensibilidade musical
dos músicos.
Se a presença feminina na confecção da
flauta tsidupo se apresenta na sutileza da fiação de suas cordas de algodão
tingidas de vermelho urucum, é pela dupla Miguelio e Paulo que o público começa
a conhecer os segredos milenares do povo Xavante, fortalecendo o diálogo entre
almas tão diferentes, mas que dão sentido a este Brasil multicultural.
Serviço: A Casa do Parque está localizada na Rua Marechal Severiano de Queiroz,
nº 455, bairro Duque de Caxias, Cuiabá-MT, próximo à entrada dos fundos do
Parque Mãe Bonifácia. Informações: 3365-4789.
Fonte: Circuito MT
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