OS DOIS LADOS DE UMA
MESMA COISA
O espetáculo desta
quarta-feira no Palco Giratório foi o monólogo “A Nova Ordem das Coisas”, da
Cia. Falácia (RJ), baseado no conto de Machado de Assis “A Igreja do Diabo”;
que mostra um Diabo cansado de atuar no varejo e decide fundar uma igreja.
Novas leis são criadas, mais naturais e mais divertidas de serem seguidas, a
partir do desvirtuamento de leis já instauradas na igreja de Deus. Tudo ia bem
para o Diabo até o momento que ele vê seus fiéis infringindo as leis de sua
igreja para fazerem o bem. Machado de Assis acreditava que nenhum lado deve ser
o verdadeiro: ninguém é de todo bom e nem de todo mau. Assim como fazemos o mal
por um impulso, também podemos fazer o bem por uma inclinação natural de nossa
espécie. Como prega o conto de Machado, o espetáculo, dirigido por Claudia
Ventura com atuação de Alexandre Dantas pode ser visto de duas maneiras: ou é
um espetáculo divertido, brincalhão, e leve ou é um tanto acomodado, com uma direção
permissiva e uma atuação um tanto mecanizada. Se formos escolher a visão do
Diabo, vemos que a dramaturgia não colocou e pouco tirou do que Machado escreveu
não se preocupando com um tratamento mais acurado do texto; mas, se escolhermos
as leis da igreja de Deus, vemos que a montagem foi fiel ao conto machadiano,
buscando inserir num contexto moderno as críticas do começo do século XX.
Mantendo a benevolência poderíamos dizer que o espetáculo conseguiu divertir os
espectadores dando leveza para um texto denso; mas se nos deixarmos levar pelo
impulso do tridente, diríamos que a comicidade naturalista beirou ao stand up, muito próximo dos códigos
televisivos de comédia. O ator está tão acostumado com o espetáculo que a
mecanização dos movimentos afoga o texto, tornando tudo uma massa inaudível e
incompreensível, interrompida vez ou outra por uma brincadeira de auditório. Além
disso, houve muitos enxertos desnecessários, como longos solos de violão. Mas
tudo isso pode ser esquecido e perdoado se deixarmos as leis de Deus invadir
nossos corações, já que todos somos bons e maus. Independente de qualquer
opinião técnica, o espetáculo divertiu o público presente que encheu o teatro
do SESC Arsenal em plena quarta-feira, rindo, disposto e entregue à diversão.
Por este feito a Cia Falácia merece o apreço de Deus, e a benevolência do
Diabo. Estão juntos desde 2008, com a criação deste espetáculo e trazem para o
Palco Giratório mais uma peça, que será apresentado na quinta-feira, “Amor
Confesso”, a partir de oito contos de Arthur Azevedo. Uma comédia bem
recomendada nacionalmente. Não perca os espetáculos do Palco Giratório que
prometem inflar a cidade com produções nacionais e locais, fornecendo um
panorama da produção cênica do país. A entrada é só um litro de leite longa
vida, ou R$ 3,00! Nos encontramos lá.
Juliana Capilé
Cia Pessoal de Teatro
Integrante do Coletivo à Deriva
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